domingo, 21 de novembro de 2021

Férias de infância em Balsas, Maranhão

A cidade de Balsas, no sul Maranhão, foi o ponto de origem de minha família. Apesar de meu saudoso pai ter nascido na cidade e minha querida mãe na cidade vizinha, Riachão, eu nasci em São José dos Campos, em São Paulo, onde eles moraram catorze anos. Depois de minha chegada em Fortaleza foram algumas vezes quando criança e outras tantas na juventude e idade adulta que me desloquei para Balsas, com o objetivo de passar as férias, brincar muito e depois tomar muito banho naquele rio maravilhoso, o Rio Balsas, com suas águas límpidas e cristalinas, em especial nos meses do meio do ano. Quando muito novo apenas nos banhos de rio acompanhados e mais tarde me atrevendo até a pular da ponte antiga uma vez. Uma sensação momentânea que para que não conhece é indescritível.

Viagem de avião

Uma das viagens foi de avião, pela companhia aérea Cruzeiro do Sul, acompanhado de minha prima Lourdes Santos (Lourdinha) que morava em Fortaleza e me levou para a casa da Tia Lourdes Pereira, casada com o Dr. Gonzaga. Voo pinga-pinga, de Fortaleza a Balsas eu acredito, pelo que conheço hoje em dia, que a rota aérea seria mais ou menos por cima do que hoje é a CE-020. Nota: resta dizer que desta viagem, realizada em 1961 para o ano de 2021 o aeroporto de Balsas não mais funcionou para voos comerciais, operando apenas com aeronaves particulares e que somente agora segundo notícias o aeroporto será redimensionado para voos e preparado para receber aeronaves maiores. 

Os encantos do Rio Balsas

O Rio Balsas, até hoje a atração maior da cidade, com a sua ponte de madeira e os portos, onde homens e mulheres tomavam banho em locais distintos. Depois dessa temporada tudo se transformou e a cultura da igualdade teve início.

Um mês inteiro de novidades!  

E os parentes mais próximos, as pessoas que com eles conviviam e os ajudavam como a Nilza, que gentilmente cuidava de minha roupa e a engomava com aqueles ferros quentes na brasa. Lembro muito do Baltazar, que trabalhava para a Farmácia e de outro funcionário chamado Zé. Ainda dos primos, além da Lourdinha, de seus queridos irmãos e meus primos José Bernardino e Gonzaguinha (in memoriam). Como o meu pai tinha me dado uma mesada para eu poder gastar alguma coisa em Balsas eu entreguei logo aquela grana para a Tia Lourdes, pedindo que ela tomasse conta para mim. E depois ficava pedindo um pouco para comprar pilhas e luzinhas para fazer pequenas instalações de acender as lâmpadas ao lado da cama, montadas com buriti, que é um tipo de palmeira existente na região amazônica usada para fazer flutuar as antigas balsas, com seus talos amarrados como também de fácil manuseio para o artesanato. Havia quem fizesse carros de brinquedo, aviões, tudo de buriti! E dessas palmas se extraiam os “pregos” que nada mais eram do que pedaços dos talos que seguravam as partes em todas as montagens.

Moravam na mesma casa, além logicamente da família da Tia Lourdes, também o Nazir, que era um auxiliar, muito bem tratado, mas que quando saía na rua na época sofria demais o que chama “bulling” por parte da meninada, quando ele ficava muito zangado, mas parece que não entendia muito bem as coisas. Certamente tinha alguma deficiência. Comigo o Nazir sempre foi legal e mostrava seu sorriso tentando murmurar alguma coisa, quando nos encontrávamos pela casa. E ainda: a história do mudo do Salomão, que existia na cidade. Uma pessoa que tinha um fôlego enorme e que conseguia atravessar o rio, por baixo d’água, levantar um braço, mergulhar novamente e retornar para a mesma margem do rio! Soube que ele foi quem mergulhou uma vez para amarrar um cabo de aço em um caminhão que tinha caído no rio, acontecimento que muitos presenciaram.

Umas férias e tanto

Neste mês eu conheci de tudo: garapa de rapadura, beber água no pote e na moringa, luz elétrica que só funcionava até as 22 horas e depois tínhamos que acender as lamparinas. Vi também geladeira a querosene! E faltou essa: ser presenteado pela Tia Lourdes com um “saco de refrigerantes”. Sim, as garrafas de guaraná vinham dentro de um saco, com muita raspa de madeira para não quebrar. Enfim era uma surpresa atrás de outra. E uma das sensações era a de ir até ao pequeno aeroporto esperar os aviões que traziam os filmes para o cinema local. O pessoal ficava embaixo da asa do avião, para se proteger do sol, e ali esperavam os funcionários descarregar as bagagens que tinham pelo meio os rolos de filmes e cartazes que víamos em primeira mão! A realidade em Balsas era mais vida, pois em São José dos Campos, onde nasci, era uma cidade de clima muito frio e não tínhamos os contatos pessoais como os que eu encontrei em Fortaleza e em Balsas!

Uma mordida de cobra?

Pelo meio desse mês eu voltava da casa de minha avó materna, Nemézia Santiago Pereira, bem na esquina perto da loja do Sr. Joaquim Coelho, na Praça da Prefeitura hoje em dia. A vovó tinha uma quitanda, local onde eu admirava as mercadorias que ela vendia, ou seja, praticamente tudo!   Depois de tomar minha garapa de rapadura, que ela preparava com todo gosto, e de ter chupado algumas laranjas, retornava para o centro da cidade para a casa de Tia Lourdes. De repente bati o pé em uma pedra, me pareceu, mas pessoas em volta me mostraram uma cobra bem perto que se afastava rapidamente. Machuquei o pé e alguns diziam que tinha sido uma picada da cobra. Apressadamente corri para a casa onde o Tio Gonzaga, farmacêutico experiente, examinou o machucado, limpou e desinfetou tudo assegurando que não tinha sido nada de cobra, apenas o susto.

Um presente inesperado

Como o meu dinheiro rendeu: olhem como fiquei surpreso e muito feliz quando no final das férias estava me despedindo do pessoal e chegou a Tia Lourdes, me deu um abraço e perguntou: - Sabe aquele dinheiro que seu pai deu para você? E eu assenti com um gesto. E ela pegou um envelope e colocando em minha mão disse: - Pois guarde que ele está aqui e continua sendo seu!

Vieram diversas outras temporadas, em diferentes idades, que relatarei em outra oportunidade. Com todas as dificuldades do acesso pelas estradas até que em determinado ano fizeram o asfaltamento de Floriano, no Piauí, até Balsas, um trecho de 410 quilômetros, muito difícil de ser percorrido antigamente. Todas que até hoje me trazem recordações muito felizes. Dentre elas quando aprendi a dançar nas tertúlias, depois a época das brincadeiras de pera, uva e maçã com as meninas, as paqueras. E mais tarde com o nosso Conjunto Big Brasa, que foi o primeiro conjunto musical a se apresentar em Balsas, com guitarras, trazendo a novidade da Jovem Guarda. Inesquecíveis os passeios para a fazenda do Bernardino, com todos os parentes e amigos, as caçadas e pescarias, quando fazíamos acampamento em plena selva, muito acima da cidade de Balsas, subindo o rio em lanchas a motor.

Foram bons e inesquecíveis tempos que só retornam através de nossas lembranças!

João Ribeiro das Silva Neto

Em novembro de 2021